Enquanto Senna topava correr “de graça” pela Williams, Mansell armou um barraco por causa do salário
O dia 13 de setembro de 1992 foi marcante na história da Fórmula 1, não tanto pela corrida em Monza, que viu Ayrton Senna vencer após problemas nas Williams de Nigel Mansell e Riccardo Patrese, mas pelos bastidores agitados.
Irritado com a equipe que exigia uma redução salarial para 1993, Mansell anunciou sua retirada da F1. Mas por que a Williams queria reduzir o salário do piloto que lhes trouxe o título de 1992? A explicação se resume a um nome: Alain Prost.
A situação ainda ganhou outros contornos quando Ayrton Senna entrou na história. O piloto brasileiro queria de qualquer forma pilotar pela equipe que era a responsável pelo carro de outro mundo, como o próprio Senna apelidou as máquinas. A vontade do brasileiro era tanta que ele se ofereceu a correr pela equipe “de graça”.
Prost agindo na surdina em busca do retorno a F1
Após decidir tirar um ano sabático da Fórmula 1 após a humilhante demissão da Ferrari no fim de 1991, Alain Prost agiu nos bastidores junto à Renault e à Elf, fornecedoras de motores e combustíveis da Williams, para garantir uma vaga na melhor equipe da categoria para a temporada de 1993. Em outras palavras, ele deu um passo atrás para avançar dois ou mais à frente.
Ele logo tratou de vetar seu rival Ayrton Senna, que também estava negociando com a Williams diretamente com os donos Frank Williams e Patrick Head. Prost também vetou Nigel Mansell, com quem teve uma convivência difícil na Ferrari e que estava a caminho do título de 1992. Em resumo, Prost não queria concorrência interna.
Os meses passaram, Mansell garantiu o título de 1992 com uma antecedência inédita e estava no auge da carreira. Naturalmente, ele queria um aumento salarial, especialmente porque, aos 39 anos, estava em seus últimos momentos na F1. Se não conseguisse um bom contrato naquele momento, nunca mais teria essa oportunidade. Além disso, Mansell estava ciente das movimentações de Prost.
Embora o veto de Prost a Mansell tenha sido retirado, surgiu outra questão. A Renault e a Elf estavam dispostas a pagar os salários de Prost, mas não queriam investir mais do que o necessário para os honorários de Mansell. Como a Williams também não tinha recursos para bancar os salários de dois campeões mundiais, sugeriu a Mansell uma redução salarial. Claro, o Leão rugiu alto ao ouvir isso, criando uma crise. Para complicar ainda mais, veio Senna com a declaração que estaria disposto a correr “de graça” pela Williams.
Mansell resolveu se mexer
Desesperado, Mansell aceitou se reunir com Ron Dennis, chefe da McLaren, que temia perder Ayrton Senna. Sem a Honda, que anunciou sua saída da F1 no fim de 1992, e sem chances de ir para a Williams, Ayrton considerava se afastar da F1 em 1993. Mesmo com a rivalidade entre eles, Dennis e Mansell se encontraram na Itália.
Mansell ouviu as propostas de Dennis e, apesar do tom amistoso e profissional da reunião, recusou a oferta para correr pela McLaren. A verdade é que a animosidade entre eles ainda era forte; ambos eram figuras difíceis. Cansado da pressão de todos os lados, Mansell convocou uma coletiva de imprensa no domingo de manhã.
Quando estava prestes a anunciar sua retirada da F1, uma cena bizarra aconteceu: o gerente de negócios da Williams, Sheridan Thynne, e seu vice, Gary Crumpler, interromperam Nigel para informar que a proposta salarial feita em Budapeste, onde o Leão conquistou o título um mês antes, havia sido aceita por Frank Williams. No entanto, o Leão mostrou suas garras e fez o anúncio:
– Devido a circunstâncias que não posso controlar, decidi me retirar da F1. Tomei essa decisão com algum pesar, mas não sem pensar muito. A relação entre piloto e equipe é vital para o sucesso, e o dinheiro faz parte disso. Mas quem me conhece sabe a importância que dou ao fator humano, ao respeito mútuo, ao jogo limpo. Com a Williams, tínhamos feito um acordo antes do GP da Hungria. Mas, três dias depois, recebi uma ligação para avisar que Senna aceitou “correr de graça”. Na verdade, eu, o campeão mundial, teria de aceitar uma grande redução salarial em relação ao que havia sido concluído. Se eu não concordasse na hora, Senna estava pronto para assinar à noite. Rejeitei tal oferta.
Na verdade, Senna jamais teria assinado com a Williams devido ao veto explícito de Prost. Era um jogo de cartas marcadas. A retirada do veto a Mansell estava baseada na proposta de uma redução salarial que o inglês jamais aceitaria. Prost, conhecido como “Professor”, demonstrava sua habilidade até nos bastidores.
Em Monza, Mansell liderou parte da prova, abriu caminho para seu companheiro Riccardo Patrese vencer, mas ambos tiveram problemas na suspensão da Williams, permitindo a vitória de Senna.
Na corrida seguinte, em Portugal, o brasileiro não poupou críticas e chamou Prost de “covarde” em uma coletiva histórica. Esse episódio marcou o início de uma das melhores temporadas de Senna na F1, enquanto Mansell conquistou o título da Fórmula Indy em 1993.